Tarifaço acende alerta em municípios brasileiros
- Henrique Reichert
- 5 de abr.
- 4 min de leitura
A recente implementação de tarifas abrangentes pelo governo de Donald Trump, o tarifaço, já começa a gerar apreensão em diversos setores da economia global, e no Brasil, municípios com forte dependência das exportações para os Estados Unidos devem estar em alerta.
Em 2024, o Brasil registrou um volume total de exportações de USD 337 bilhões, com um saldo comercial positivo de USD 74,1 bilhões. Os Estados Unidos se consolidaram como o segundo principal parceiro comercial do país, respondendo por 12% das vendas externas brasileiras, totalizando USD 40,3 bilhões – um aumento de 9,4% em relação a 2023. A China lidera como principal destino das exportações, com 28%.
Entre os produtos que o Brasil mais vende aos americanos, destacam-se materiais da indústria de transformação e extrativa, como ferro, aço e óleos de petróleo, além de itens de maior valor agregado como peças de aeronaves. Produtos do agronegócio também marcam presença, como sucos de frutas, celulose e café.
Mais de 1,1 mil municípios brasileiros realizaram exportações para os Estados Unidos em 2024. A dependência dessa relação comercial é ainda mais evidente quando se observa que, para cerca de 100 dessas cidades, os EUA são o único destino de suas vendas ao exterior, e para outras 537, representam o principal parceiro comercial.
Municípios na Linha de Frente do Impacto Tarifário
O "tarifaço" de Trump, de abril de 2025, com a imposição de uma tarifa base de 10% sobre todas as importações americanas, e tarifas recíprocas ainda maiores para países com grandes déficits comerciais com os EUA, poderá atingir de forma significativa algumas economias locais brasileiras.
Aeronaves de Gavião Peixoto (SP)
O pequeno município de Gavião Peixoto, no interior de São Paulo, com apenas 4,7 mil habitantes, abriga as instalações da Embraer dedicadas à produção e exportação de peças de aeronaves. Em 2024, as vendas para os Estados Unidos ultrapassaram os USD 500 milhões, representando expressivos 63% do total das exportações da cidade. Com cerca de 2,3 mil trabalhadores ocupados no setor aeronáutico, qualquer retração nas compras americanas pode ter um impacto considerável na economia local e no mercado de trabalho.
A produção de café em Espera Feliz e Manhumirim (MG)
Os municípios mineiros de Espera Feliz e Manhumirim, conhecidos pela produção de café de alta qualidade, também podem sentir os efeitos das novas tarifas. Em 2024, Espera Feliz exportou USD 91 milhões em café para os EUA, enquanto Manhumirim alcançou USD 106 milhões. Embora os Estados Unidos representem menos de um terço das vendas externas dessas cidades, a cafeicultura desempenha um papel crucial na economia e na geração de renda para muitas famílias da região.
Agronegócio de sucos em Colina (SP) e Conde (BA)
No setor de sucos de frutas, Colina (SP) e Conde (BA) se destacam como importantes exportadores para o mercado americano. Colina, com um volume de vendas muito maior, exportou USD 244 milhões em 2024, sendo 35% destinados aos Estados Unidos. Já Conde, apesar de um volume menor, com cerca de USD 22 milhões, tem nos EUA seu principal comprador, representando quase a totalidade de suas exportações. A imposição de tarifas pode encarecer o produto brasileiro, tornando-o menos competitivo no mercado americano.
Setor da Madeira em Salete (SC)
O município catarinense de Salete tem na venda de produtos de carpintaria sua principal atividade econômica. Em 2024, as exportações para os Estados Unidos somaram USD 63 milhões, representando 93% do total de suas vendas externas. O setor madeireiro emprega cerca de metade dos trabalhadores formais da cidade, o que torna a economia local particularmente vulnerável a qualquer medida que dificulte o acesso ao mercado americano.
Outros Setores em Alerta
Além dos municípios destacados, outros com forte presença no mercado americano também devem ficar atentos. São Gonçalo do Amarante (CE), com quase USD 300 milhões em exportações de produtos semimanufaturados de ferro, pode ser significativamente afetado, assim como municípios que exportam produtos de origem animal, como Governador Edison Lobão (MA) e Cruzeiro do Sul (RS).
Reação do Brasil e Cenário Global
O governo brasileiro já manifestou seu "pesar" pela decisão unilateral dos Estados Unidos de impor tarifas adicionais de 10% sobre todas as exportações brasileiras, conforme nota divulgada pelo Ministério das Relações Exteriores e pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços em 2 de abril de 2025.
A nota ressalta que a medida "viola os compromissos dos Estados Unidos na Organização Mundial do Comércio (OMC)" e impactará todas as exportações de bens brasileiros para o país norte-americano. O governo brasileiro também destacou o superávit comercial americano com o Brasil, que em 2024 atingiu cerca de USD 7 bilhões em bens e USD 28,6 bilhões quando considerados bens e serviços.
O cenário é de incerteza, e os municípios brasileiros com forte ligação comercial com os Estados Unidos precisarão monitorar de perto os desdobramentos do "tarifaço" de Trump e buscar alternativas para mitigar os potenciais impactos negativos em suas economias locais. A diversificação de mercados e o fortalecimento da competitividade interna podem ser estratégias cruciais para enfrentar este novo desafio no comércio internacional.
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